domingo, 27 de julho de 2008

17º Domingo do Tempo Comum – 27 de julho de 2008

O sonho do Reino de Deus

A primeira Leitura (1Rs 3,5.7-12) da liturgia deste domingo quer nos ensinar que o poder deve estar a serviço do povo. Por volta de 971 a.C., o rei Salomão herdou de seu pai Davi um grande império, para administrar sabiamente. Em sua generosidade, Javé lhe permite pedir o que quiser. Em seu diálogo com Deus, Salomão reconhece que, em suas limitações e incapacidades, não sabe governar. O rei tinha três funções importantes: governar – sendo responsável pelo bom uso dos bens públicos em vista do bem-estar de todos; julgar – promovendo a justiça sem discriminações ou privilégios; ter bom senso e discernimento, fazendo bom uso do poder, em benefício de todos. Em sua relação com Deus, cabe ao rei uma atitude de servo, fazendo Sua vontade. Em relação ao povo cabe-lhe cuidar, pois este pertence a Deus.

Com a humildade de um servo, Salomão pede a Deus um coração compreensivo e sabedoria para bem governar. Há coisas que nem se pode pedir a Deus, mas isto certamente Deus pode oferecer. Assim também somos nós, só podemos oferecer o que temos em abundância. Quando não conhecemos a Deus, acabamos por pedir o que Ele não pode nos dar, e nossas orações podem não ser atendidas.

Embora a Sagrada Escritura nos revele que, posteriormente, sua administração tenha se pervertido, a atitude de Salomão é digna de admiração. Antes de começar a caminhar precisamos reconhecer em Deus um companheiro de caminhada. Pervertido pelo poder, a administração de Salomão não foi um bom exemplo, mas um vírus que passou a seus sucessores e culminou com a desgraça do exílio. Situando a oração de Salomão no inicio de seu reinado, a Sagrada Escritura quer nos fazer uma advertência: embora as intenções iniciais sejam boas, a febre do poder pode nos impedir de agir conforme a vontade de Deus. Na verdade, tudo o que pedimos a Deus recebemos em forma de semente, que precisa ser cultivada em nossa vida, se pretendemos colher bons frutos.

No Evangelho (Mt 13,44-52), com as parábolas do tesouro escondido e da pérola preciosa, Jesus focaliza o tema da opção radical pelo Reino de Deus, diante do qual vale a pena arriscar tudo, pois é o único valor absoluto. O texto quer mostrar que a alegria de quem dedica sua vida pela causa do Reino deve ser igual à alegria de quem encontra um tesouro valioso. Tudo o mais se torna relativo, em vista do Reino. Imaginemos como seja a reação de quem encontra um tesouro! Assim deve ser o estado de ânimo de quem descobre que o caminho do amor-serviço é o único capaz de fazer surgir uma sociedade mais justa e fraterna.

Embora seja um tesouro precioso, o Reino de Deus está ao nosso alcance, basta acolhê-lo. Quem o acolhe se torna companheiro de Deus e coloca acima de tudo em sua vida a prática da justiça e do amor, ‘vendendo’ tudo o mais. Quando encontramos algo de maior valor para nós, facilmente abrimos mão daquilo que parecia sagrado. As vezes nos parece impossível deixar de lado certas práticas, mas quando sentimos a imensa satisfação em praticar o bem, mudamos de idéia. Embora as parábolas tenham um sentido mercadológico, não podemos pensar que o Reino seja uma negociação financeira. A mensagem central quer nos mostrar que nada faz falta a quem descobriu o sentido e o valor da luta pela justiça.

Por sua vez, a parábola da rede lançada ao mar dá continuidade ao tema da parábola do joio no meio do trigo (liturgia do domingo passado) e tem sabor de escatologia final. Embora na sociedade convivem lado a lado “peixes bons” e “peixes ruins”, não cabe a nós julgar. Deus, em sua misericórdia, fará a ‘separação final’. O texto sugere que são úteis ao Reino apenas os ‘peixes bons’, isto é, aquelas pessoas que se dedicam em praticar a vontade de Deus. Assim, somos chamados ao discernimento, compreendendo a mensagem do Reino e dando continuidade à prática de Jesus que o torna possível.

Por fim, ao falar do mestre da lei que se torna seu discípulo, Jesus nos mostra que sua novidade não precisa necessariamente eliminar aquilo que a Escritura cultiva como preciosidade. O tesouro da salvação contém preciosas experiências de fé, feitas pelo povo de Deus, que nos ajudam a ser autênticos cristãos. Podemos também entender a comparação de Jesus com a necessidade que temos de adaptar a mensagem salvífica às novas situações e desafios que nos cercam.

No texto da II Leitura (Rm 8,28-30) deste domingo, Paulo manifesta a certeza de que tudo contribui para o bem daqueles que amam a Deus, isto é, aqueles que acolhem Seu projeto e procuram viver de acordo com a Sua vontade. Ele sabe que o Deus de amor cria a todos para a glória e não para o fracasso. A fragilidade humana não é mais forte do que o amor de Deus, revelado abundantemente em Jesus. Somos verdadeiramente filhos de Deus quando conformamos (sintonizamos) nossa vida à de Jesus, o primogênito de uma sociedade fraterna que tem um só Pai, Deus. Movido por sua infinita misericórdia, o próprio Deus conduz a vida daqueles que intentam viver como seus filhos. Cabe ao cristão deixar-se guiar por esse Pai que deseja a todos salvar. Nesse caminho nos tornamos companheiros seus na edificação de Seu Reino de Amor.

Podemos dizer, a partir da liturgia deste domingo, que o Reino é uma aspiração divina e humana. A Sagrada Escritura nos revela que é da vontade de Deus um mundo mais justo e fraterno, onde todos tenham vida em abundância. Em sintonia com a vontade divina, cada cristão é chamado a viver sua fé na prática do bem, tornando realidade ao sonho de Deus e de toda pessoa de boa vontade. Nessa caminhada, o poder e a riqueza, mal utilizados, podem se tornar empecilhos para o Reino de Deus. Daí a importância de, humildemente, pedir a Deus sabedoria e um coração compreensivo, para agir conforme Sua vontade.
Abraço fraterno, e que Deus abençoe a todas as famílias.
(j.z)

quarta-feira, 9 de julho de 2008

Palavra de Deus, palavras de vida!

Palavra de Deus, Palavras de Vida!

O espaço que a Palavra de Deus ocupa em nossa vida de cristãos reflete a profundeza de nossa fé e a intensidade com que buscamos o mais precioso alimento para essa mesma fé. Regando nossa vida com Sua palavra, Deus cuida de nós como um dedicado jardineiro que dá a própria vida pelo seu jardim. Em Suas palavras encontramos alento para os dias mais difíceis, fortaleza nos momentos de fraqueza, coragem no desânimo, consolo na dor, orientação na incerteza, luz nas escuridões da vida. Se a buscamos, como peregrinos, é porque fazemos coro com o apóstolo que diz “a quem nós iremos, Senhor, só tu tens palavras de vida”.

Sempre atual, a Palavra de Deus não deixa de ser expressão de um povo, de uma época, de uma realidade própria. Aí se explicam as dificuldades que muitas vezes encontramos no texto. Sem um pouco de consciência crítica podemos desvirtuar a preciosa mensagem que ela contém para os dias de hoje. É preciso reconhecer que, embora mudam os tempos, mudam as pessoas, mudam as realidades e circunstâncias, a mensagem de Deus a seus filhos continua sempre atual. Certamente em dois mil anos as comunidades destinatárias da Palavra de Deus mudaram muito, no entanto, as dificuldades para se viver a fé continuam, embora tomam sempre novas configurações. Se, por exemplo, João escreve o Apocalipse na tentativa de animar e fortalecer a comunidade diante das perseguições sofridas, hoje esse mesmo texto bíblico pode nos animar e fortalecer diante de outras “perseguições”, ou fortalecer aqueles a quem nós perseguimos.

Embora muitas vezes usamos a Bíblia para fundamentar certas atitudes ou até justificar injustiças, a Palavra de Deus tem como destinatários preferenciais aqueles mesmos que eram os preferidos de Jesus, os mais necessitados. Muitas nações e muitos poderes opressores já buscaram justificação bíblica para ações claramente anti-cristãs. E uma leitura séria da Bíblia não abre espaço algum para tais fundamentações. O povo da Bíblia é um povo oprimido, em sua longa e árdua caminhada em busca de libertação. No agir de Deus, desde o envio de Abraão até o envio do Espírito Santo, em Pentecostes, percebemos um Deus empenhado em salvar os seus, principalmente aqueles que precisam de salvação e que se abrem para acolher a salvação que Ele oferece. A Bíblia é isso, expressão de fé de um povo que reconhece Deus agindo em sua história, sendo fiel a seu plano de salvação.

É sempre mais nosso desejo que a Palavra de Deus seja acolhida, compreendida e vivida por cada cristão. Assim como a terra não produz frutos sem acolher a semente, em nossa vida não produziremos os frutos que Deus espera de nós se não soubermos acolher e deixar germinar em nós essa semente de vida que é sua Palavra. Se nosso agir é sempre expressão daquilo que guardamos em nosso coração, sejamos, então, capazes de acolher essa Palavra de Deus para que nosso viver seja, a exemplo das grandes testemunhas da Igreja, agradável a Deus. Em nosso caminhar, em nossa vida, seja a Palavra de Deus lâmpada para nossos pés e luz para nossos caminhos. Então, nesse caminhar, estaremos edificando o Reino de Deus, um mundo de paz e fraternidade.
(j.z)